Mudanças climáticas
e a sociedade

Sol: fonte de energia para a Terra

Para estudarmos nossa atmosfera e entendermos as mudanças climáticas, precisamos falar sobre nossa principal fonte de energia. Você já parou para pensar como seria a Terra sem a presença do Sol? E a nossa atmosfera? Será que existiríamos? Bom, muito provável que não.

A maior fonte de energia que temos e que é responsável por diversos processos que ocorrem na Terra vem do Sol, a estrela central do nosso Sistema Solar. O Sol emite radiação em praticamente todo o espectro eletromagnético, no entanto, cerca de 30% dessa radiação é refletida pela superfície da Terra, permanecendo 70% no nosso planeta.

A energia do Sol que chega na Terra aquece primeiramente a superfície, através de processos físicos entre a superfície e a atmosfera, e depois o ar logo acima. Porém, o aquecimento da Terra não acontece de forma uniforme entre os polos e o equador. Por conta do formato da Terra, os raios solares atingem os polos de nosso planeta de forma inclinada, ao passo que nas regiões tropicais a incidência é quase perpendicular à superfície. Isso resulta em menor concentração de energia nos polos e maior próximo ao equador. Desta forma, as regiões tropicais se aquecem mais do que as polares.


No entanto, a região tropical não consegue emitir para o espaço toda a energia que recebe do Sol, em parte devido à quantidade de nuvens existentes nesta região. As nuvens servem como uma barreira na nossa atmosfera, fazendo com que parte da radiação fique retida próximo à superfície. Já nas regiões polares, por conta da presença de gelo, existe maior emissão do que recebimento de energia. Isso ocorre pois além de existir uma menor quantidade de nuvens nesta região, o gelo possui alto poder de reflexão da radiação.

Mas como resolver este desequilíbrio de energia? Os grandes responsáveis por balancear esta energia são nossos oceanos e atmosfera. Nosso planeta é tão magnífico que busca o equilíbrio térmico da seguinte forma: o maior aquecimento nos trópicos e menor nos polos gera o que chamamos de gradiente de temperatura, ou seja, o aquecimento diferenciado entre trópicos e polos. Sabemos que as regiões dos trópicos e equatorial recebem mais energia fazendo com que haja maior aquecimento próximo à superfície. Por sua vez, este ar quente é mais leve que o ar frio e então ele sobe; em contrabalanço, este ar que subiu precisa descer em outra região. Somadas a essas “subidas” e “descidas” das colunas de ar, tem-se ramos horizontais, próximos à superfície e no topo da nossa troposfera, gerando assim uma célula de circulação responsável por balancear a energia na atmosfera. Na nossa atmosfera existem três células principais de circulação em larga escala em ambos os hemisférios: (1) a célula de Hadley, onde o ramo horizontal próximo à superfície dirige-se ao equador e no topo da troposfera dirige-se aos polos - nesse caso, o ar sobe na região equatorial e desce em torno de 30° de latitude; (2) a célula de Ferrel, com os ramos horizontais opostos à de Hadley, onde o ramo que sobe fica em torno de 60° de latitude e o ramo que desce em aproximadamente 30° de latitude, mesma região que desce o ramo de Hadley; e (3) a célula Polar, semelhante à de Hadley, porém com o ar descendo nos pólos e subindo em torno de 60° de latitude.

Além da circulação geral, existem circulações em menores escalas espaciais, que ocorrem através de regiões alternadas de altas e baixas pressões, onde na alta pressão o peso da coluna de ar é maior (ar descendo) e na baixa pressão, menor (ar subindo). Estas diferenças de pressão levam à formação dos ventos que acabam transportando ar com diferentes características de uma região para a outra. Um exemplo é o transporte de ar seco e frio dos polos para a região tropical e ar úmido e quente da região tropical para os polos. Este transporte de massas de ar acaba contribuindo também para a circulação geral da atmosfera. No oceano, por outro lado, formam-se as correntes marítimas, onde o processo de transferência de calor entre polos e trópicos é similar ao da atmosfera.

Troposfera é a camada da atmosfera onde os principais fenômenos meteorológicos ocorrem; sua altura varia de acordo com a latitude, sendo mais alta próximo ao equador (aproximadamente 20 km) e mais baixa nos polos (aproximadamente 8 km).

O ramo onde as células de Hadley e Ferrel descem geram regiões permanentes de alta pressão sobre os oceanos subtropicais enquanto que sobre os continentes geram os desertos, tais como o deserto do Saara ao norte do continente africano.

Como e por quê existem as estações do ano?

Basicamente, existem dois fatores combinados que levam à existência das estações do ano: a inclinação da Terra com relação ao plano da sua órbita e o movimento que a Terra faz ao redor do Sol (translação) por aproximadamente 365 dias. Conforme a Terra realiza o movimento de translação, ou seja, à medida que ela “viaja” ao redor do Sol, um dos Hemisférios (Norte ou Sul) fica mais exposto à radiação solar (pois a Terra está inclinada) e é nesta parte que o verão acontece.

O Hemisfério Sul, onde grande parte do Brasil se situa, recebe mais radiação solar entre dezembro e março, comparado ao Hemisfério Norte, caracterizando o nosso verão austral. O início do verão austral ocorre quando os raios solares incidem diretamente sobre o Trópico de Capricórnio (situado no Hemisfério Sul, na latitude de 23,5°S). Isto acontece no dia 21 ou 22 de dezembro. Por outro lado, este é o momento em que o Hemisfério Norte inicia o seu inverno, o inverno boreal.

Entre junho e agosto o Hemisfério Sul recebe menos radiação solar comparado ao Hemisfério Norte. Este último, por sua vez, fica voltado para o Sol. Portanto, é nesta época do ano que ocorre o verão boreal (verão do Hemisfério Norte) e o inverno austral (inverno do Hemisfério Sul). A data que marca o início do nosso inverno é 20 ou 21 de junho, que é quando os raios solares incidem diretamente sobre o Trópico de Câncer (situado no Hemisfério Norte, na latitude de 23,5°N).

As datas mencionadas acima, que marcam o início do inverno e do verão, são chamadas de Solstícios.

As estações de primavera e outono iniciam quando os raios solares atingem diretamente a linha do equador (latitude de 0°). No Hemisfério Sul, quando isto ocorre após o verão, em 19 ou 20 de março, inicia-se o outono austral, e quando ocorre após o inverno, por volta de 22 ou 23 de setembro, inicia-se a primavera austral. Estas datas são chamadas de Equinócios. Nestas datas específicas, ambos os hemisférios recebem a mesma quantidade de radiação solar.

POSIÇÃO DA TERRA EM RELAÇÃO AO SOL EM CADA EQUINÓCIO E SOLSTÍCIO

Você sabe a diferença entre tempo e clima?

O termo tempo é utilizado para se referir ao estado momentâneo da atmosfera, ou seja, o que percebemos da atmosfera no nosso dia a dia, como uma manhã nublada, uma tarde ensolarada, um dia frio ou quente etc. Clima, por outro lado, refere-se ao estado médio da atmosfera, ou seja, a média de eventos de tempo de um período longo. Para sabermos o clima de uma dada região utilizamos, por exemplo, informações de estações meteorológicas, satélites, boias meteoceanográficas, que registram valores das variáveis atmosféricas como temperatura do ar, precipitação, umidade relativa do ar, pressão atmosférica etc. Segundo a Organização Meteorológica Mundial (OMM ou WMO em inglês), o clima é definido pela média dessas variáveis em um período de 30 anos.

Então, agora você já sabe: quando alguém falar “Nossa, o clima está muito seco hoje!” ou “O clima vai esquentar nesta semana!”, você pode responder que a escolha da palavra “clima” não está correta na frase; o correto seria falar: “Nossa, o tempo está muito seco hoje!” ou “O tempo vai esquentar nesta semana!”.

Usualmente em meteorologia consideramos que no Hemisfério Sul os meses de dezembro a fevereiro (DJF) correspondem ao verão, de março a maio (MAM) ao outono, de junho a agosto (JJA) ao inverno e de setembro a novembro (SON) à primavera. Ou seja, existem as datas oficiais de início das estações, porém, na prática, em ciências da Terra consideramos os trimestres com os meses completos.

Quando falamos austral nos referimos ao Hemisfério Sul e quando falamos boreal, ao Hemisfério Norte.

Você sabe por que o Sol nasce no setor Leste e se põe no setor Oeste?

Por conta do sentido de rotação da Terra que é de Oeste para Leste (ou seja, a Terra gira no sentido anti-horário se imaginarmos um corte olhando o planeta acima no pólo norte). Isto causa o movimento aparente do Sol na orientação Leste-Oeste.

O que são os pontos cardeais Leste e Oeste?

São os pontos onde o equador celeste cruza o horizonte.

O Sol nasce sempre exatamente no ponto cardeal Leste e se põe no Oeste?

Não, o Sol apenas nasce exatamente no ponto Leste e se põe exatamente no ponto Oeste nas datas de Equinócios, que marcam a entrada das estações outono e primavera. Nestes dias específicos, o dia e a noite possuem igual duração de 12 horas. No Hemisfério Sul, após o início da primavera e durante o verão, o Sol nasce à direita do Leste, mais ao Sul, enquanto que após o início do outono e durante o inverno, o Sol nasce à esquerda do Leste, mais ao Norte.

As datas e horários dos solstícios e equinócios variam, pois o ano possui aproximadamente 365,2422 dias, ou seja, não é um número exato. Os anos bissextos (que têm 366 dias) existem como uma forma de “compensar” esta variação. Isto acaba influenciando o início de uma nova estação a cada ano quando comparado ao ano anterior.

Clima no Brasil

O Brasil é um país de dimensões continentais, isto é, com uma expressiva extensão territorial. Por conta disso, o clima do Brasil não é exatamente o mesmo em todo o país, ou seja, diferentes regiões apresentam diferentes características climáticas, as quais também variam ao longo do ano. Já sabemos que as diferentes estações do ano (verão, outono, inverno e primavera) ocorrem em função de variações na incidência de radiação solar recebida em nosso planeta, enquanto ele gira ao redor do Sol (translação) com seu eixo de rotação inclinado. Sabemos também que, na meteorologia, as principais variáveis utilizadas para caracterizar o clima em uma dada região são a temperatura e a precipitação. Tendo em vista estes conceitos, iremos analisar as figuras a seguir, que ilustram, em termos de temperatura e precipitação, os valores médios climatológicos observados no Brasil em cada uma das estações do ano. O período climatológico considerado para computar estes valores médios engloba todos os anos desde 1981 até 2010.

A região Sul apresenta as quatro estações do ano bem definidas; a chuva ocorre regularmente ao longo do ano, enquanto a temperatura apresenta maiores variações entre as diferentes estações do ano. No verão, as temperaturas máximas ultrapassam 30oC, mas a amplitude térmica é menor, ou seja, a diferença entre o valor absoluto das temperaturas mínimas e máximas do dia é menor. Já na primavera e outono, as temperaturas máximas podem até alcançar 30oC, mas a amplitude térmica observada ao longo do dia é em geral maior, com temperaturas mínimas da ordem de 10oC. No inverno, temperaturas próximas de 0oC são comuns, assim como as geadas.

Nas demais regiões do Brasil, as estações do ano são melhor definidas a partir das chuvas, de forma que em boa parte do tempo acabamos nos referindo a dois padrões distintos: o da estação seca e o da estação chuvosa. Entre estas, ocorrem as estações de transição, em que as chuvas atuam de forma esporádica e passageira. A estação chuvosa, como o nome já diz, possui chuvas torrenciais e acontece nos meses mais quentes (de novembro até março) sobre as regiões Norte, Centro-Oeste e Sudeste. Já a estação seca nestas regiões ocorre entre abril e setembro, quando os acumulados de chuva são significativamente menores comparados à estação chuvosa. No Sudeste e sul do Centro-Oeste, as temperaturas mínimas durante a estação seca são, no geral, mais baixas, podendo ocorrer geadas em alguns casos. No Centro-Oeste, as estações de primavera e verão apresentam as temperaturas mais elevadas. Por outro lado, no Norte do País, as temperaturas médias são mais altas durante a estação seca, até mesmo comparadas à estação chuvosa. Isto se deve à menor quantidade de nuvens no céu que permite maior aquecimento pelo Sol.

A região Nordeste do Brasil também apresenta estações seca e chuvosa; a chuvosa ocorre em fevereiro, março, abril e maio, podendo ocorrer chuvas mais abundantes e distribuídas sobre toda a região. Em junho, julho e agosto, também chove bastante sobre a faixa leste do Nordeste, embora no restante da região os acumulados de chuva sejam bem menores. Já no restante do ano, ocorre a estação seca, onde as chuvas praticamente cessam. Por outro lado, as temperaturas são aproximadamente constantes ao longo do ano, com baixas amplitudes térmicas.

A geada é um fenômeno meteorológico que ocorre quando a temperatura do ar é muito baixa, próxima de 0°C. Isto ocorre geralmente de madrugada, onde, na ausência de ventos, de nuvens e da radiação solar, ocorre a perda de calor das superfícies próximas ao solo (perda radiativa). Desta forma, o vapor de água contido no ar passará para o estado líquido, ou seja, condensa, formando o orvalho, que por sua vez é formado por gotículas de água depositadas sobre plantas e objetos. Com o contínuo resfriamento do ar próximo ao solo, o orvalho é congelado. A geada também pode ocorrer quando o vapor de água suspenso no ar bem próximo ao solo é transformado em cristais de gelo, precipitando (caindo). No Brasil, as condições para a formação de geadas são especialmente encontradas ao sul da latitude de 19ºS, que compreende os estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul nos meses de junho e julho, mas podem também ocorrer desde abril (metade do outono) até setembro (conhecidas como geada tardia ou primaveril).

MÉDIA DAS TEMPERATURAS MÁXIMAS POR ESTAÇÃO DO ANO

Valores médios climatológicos de temperatura máxima (°C) no Brasil em cada uma das estações do ano no período de 1981 a 2010.
Fonte de dados: Reanálise ERA5 do ECMWF.
Temperatura máxima
Temperatura mínima
Precipitação*
10°S
20°S
30°S
70°W
60°W
50°W
40°W
30°W
Verão Outono Inverno Primavera

Amplitude térmica: é a diferença entre as temperaturas máxima e mínima de um determinado local e período de tempo. Por exemplo, amplitude térmica diária, amplitude térmica mensal, amplitude térmica anual etc. As amplitudes térmicas ocorrem devido a alguns fatores que controlam como a radiação solar aquece a superfície da Terra e o ar adjacente e como a radiação terrestre se redistribui. Estes fatores são: altura do Sol no horizonte, intensidade e duração de radiação solar que incide na superfície da Terra, tipo de superfície (areia, neve, solo descoberto, pastagem, floresta etc), cobertura de nuvens, quantidade de gases do efeito estufa. Logo, é possível observar que existem determinantes naturais para que aconteça a amplitude térmica nas diferentes escalas de tempo como, por exemplo, a latitude do local, a hora do dia e o dia do ano.

Balanço de energia no sistema terrestre e aquecimento global

A atmosfera terrestre é composta por diversos gases e pequenas partículas (aerossóis) que exercem um papel fundamental em regular o balanço de energia em nosso planeta. E é este balanço, o qual tende a sempre buscar o equilíbrio, que controla o clima da Terra.

Vamos revisar alguns conceitos importantes sobre o balanço de energia terrestre:

Sabemos que qualquer corpo com temperatura acima do zero absoluto (0 Kelvin) emite e absorve radiação, e que a radiação emitida pelo Sol é a principal fonte de energia que alimenta continuamente o sistema terrestre.

Ao chegar em nossa atmosfera, parte da radiação solar (~30%) é refletida de volta para o espaço, e a outra parte (~70%) é absorvida por nossa atmosfera e superfície terrestres.

Tal absorção de energia solar resulta no aquecimento do sistema terrestre, que por sua vez emite radiação infravermelha em todas as direções; tal emissão de energia infravermelha leva a um consequente resfriamento do sistema terrestre, de forma que o balanço de energia tende sempre a buscar o equilíbrio; este equilíbrio significa que quase toda a energia solar que “chega” à Terra é “devolvida” para o espaço, na forma de energia infravermelha.

Entretanto, conforme mencionado, nem toda a energia infravermelha emitida retorna ao espaço. Graças à presença de alguns componentes específicos em nossa atmosfera, os quais possuem a propriedade de absorver radiação infravermelha, parte desta energia que deveria retornar ao espaço acaba sendo reabsorvida pela atmosfera e retornando à superfície terrestre, como parte do processo conhecido como “efeito estufa”. É este efeito estufa que faz com que o planeta Terra possua temperaturas e outras características climáticas compatíveis com a geração e manutenção da vida e do ecossistema terrestre. Na média, a temperatura na superfície da Terra é por volta de 15ºC.

Sem o efeito estufa, a temperatura média na superfície da Terra seria muito baixa (por volta de 18oC abaixo de zero) e incompatível com a vida como conhecemos; os oceanos, por exemplo, seriam todos congelados.

Os principais constituintes atmosféricos responsáveis pelo efeito estufa são: vapor d’água (H2O; 50%), nuvens (25%), dióxido de carbono (CO2; 20%), entre outros (5%), incluindo os gases metano (CH4), óxido nitroso (N2O), ozônio (O3) e hidrofluorcarbonetos (HFCs).

Radiação infravermelha é uma forma de energia associada à temperatura do corpo que a emite; qualquer corpo com temperatura maior que o zero absoluto emite este tipo de energia, que é invisível aos nossos olhos.

BALANÇO DE ENERGIA NO SISTEMA TERRESTRE (NÍVEIS PRÉ-INDUSTRIAIS)

VALORES TOTAIS PARA FECHAR O BALANÇO DE ENERGIA

Apesar de o CO2 ser o segundo gás mais importante do efeito estufa, estando atrás do vapor d’água, que é majoritariamente mais abundante em nossa atmosfera, o papel que este gás desempenha no balanço de energia terrestre é crucial.

O aumento de CO2 na atmosfera (o qual iremos ver mais à frente que é um resultado direto das ações do Homem) resulta em um “excesso” de gases do efeito estufa, o que por consequência aumenta a quantidade de energia infravermelha que retorna à superfície terrestre ao invés de “escapar” para o espaço. Isto faz com que haja um maior aquecimento do sistema climático da Terra, o qual vem sendo observado estar associado aos desdobramentos da Revolução Industrial, e é popularmente referido como aquecimento global.

Mas como pode a Terra estar se aquecendo se muitas vezes lemos notícias sobre regiões em que ocorrem recordes de temperaturas frias registradas?

Da mesma forma que algumas regiões do globo passam por recordes de temperaturas frias, outras regiões passam por recordes de temperaturas quentes. O aquecimento global ao qual nos referimos diz respeito aos valores médios registrados considerando todo o globo. O que tem sido observado na verdade é um aumento de eventos extremos de tempo em todo o planeta; estes eventos extremos podem ser, por exemplo, ondas de calor ou ondas de frio; fortes chuvas/inundações ou secas severas. E devemos nos preocupar com isso, pois estes eventos extremos de tempo trazem consigo um grande potencial de desastres, danos e perdas, tanto econômicas quanto humanas.

E o que são as mudanças climáticas?

Embora seja comum ouvirmos os termos “aquecimento global” e “mudanças climáticas” como se fossem sinônimos, tecnicamente existem algumas diferenças na definição de cada termo. Como vimos, o termo “aquecimento global” se refere ao aumento da temperatura média do sistema terrestre que ocorre em função do aumento da concentração de gases do efeito estufa em nossa atmosfera. Já o termo “mudanças climáticas” se refere às mudanças de longo prazo que vem sendo observadas (ao longo das últimas décadas) e projetadas (em décadas futuras) em diversas variáveis climáticas (tais como padrões de precipitação, temperatura e vento); estas mudanças decorrem tanto de fatores antropogênicos (isto é, causados pelo Homem) quanto de fatores naturais (variabilidade climática interna na Terra e outras forçantes externas) e ocasionam uma ampla variedade de efeitos em diversos aspectos dos sistemas geofísicos, naturais e humanos.

O clima da Terra nem sempre foi como conhecemos hoje; ao longo de sua história, que teve início a mais de 4,5 bilhões de anos atrás, nosso planeta já passou por diversos períodos de mudanças climáticas, intercalando períodos de eras glaciais e períodos interglaciais, de aquecimento pelo efeito estufa natural. Estas flutuações ocorreram em decorrência de forçantes naturais (tais como impactos de meteoritos, erupções vulcânicas, e variações na órbita da Terra e na energia solar) que sempre existiram e continuarão a existir no futuro. Entretanto, esta é a primeira vez na história da Terra que mudanças climáticas estão ocorrendo em decorrência de ações humanas. E estas mudanças antropogênicas vêm ocorrendo em alta velocidade, bem mais alta que mudanças naturais associadas a variações na órbita terrestre, por exemplo.

Será que o clima está mudando mesmo? Como podemos ter certeza?

Existem diversos indicadores de que o clima vem mudando desde meados do século XX; cientistas de diversas áreas do conhecimento e de todo o mundo já vêm há algum tempo alertando a sociedade acerca destas mudanças e suas implicações. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, popularmente conhecido pelo seu acrônimo em inglês, IPCC, foi criado em 1988 pela Organização Meteorológica Mundial e pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (ONU Meio Ambiente), na tentativa de agregar esforços de especialistas de todo o mundo e melhorar a nossa compreensão sobre mudanças climáticas e todas as complexas questões científicas, técnicas e socioeconômicas envolvidas. O IPCC é organizado em Grupos de Trabalho e lança periodicamente relatórios detalhados e abrangentes, além de sumários para tomadores de decisão governamentais; toda a informação é também de livre acesso para o público em geral.

Evidências de que o clima está mudando incluem:

Aumento da temperatura média na superfície da Terra, o qual pode ser comprovado através de medições locais em todo o globo e através de dados provenientes de satélites que orbitam a Terra;

Aumento da acidificação dos oceanos, o qual ocorre em virtude da maior concentração de CO2 na atmosfera que acaba sendo absorvido pelos oceanos;

Diminuição do volume do gelo marinho no Ártico, a qual vem sendo observada nas últimas décadas;

Derretimento de geleiras em todo o mundo;

Elevação do nível do mar, que em termos globais aumentou em cerca de 23 centímetros desde 1980, em virtude tanto da expansão da água dos oceanos que vem se aquecendo quanto do derretimento de geleiras e mantos de gelo sobre terra firme;

Aumento da frequência e intensidade de eventos extremos, os quais estão relacionados a mudanças observadas no ciclo global da água (com secas longas e severas em algumas regiões e com o aumento da precipitação anual em outras regiões).

Como sabemos que o Homem é responsável pela mudança climática?

Existem evidências empíricas de que o aumento de gases do efeito estufa que vem sendo observado é um reflexo da elevada emissão de poluentes em nossa atmosfera pelo Homem, associada à Revolução Industrial, que teve início em 1760. O avanço das tecnologias industriais e de produção, ao mesmo tempo em que permitiu ao Homem alcançar grandes conquistas, também acabou por gerar uma quantidade imensa de poluentes em virtude da queima de combustíveis fósseis, a qual é utilizada para produzir energia e trabalho mecânico. Nos tempos atuais, é possível constatar que quase tudo ao nosso redor deriva de processos que envolvem a queima de combustíveis fósseis: a produção de eletricidade, os meios de transporte, diversos produtos construídos através de processos industriais, entre outros. E não é só a queima de combustíveis fósseis que gera gases do efeito estufa; o desmatamento, o mau uso do solo no agronegócio em geral (pecuária, solos agrícolas, produção de arroz), e a mineração do carvão também são processos que contribuem para isso.

Já existe um majoritário consenso entre especialistas na comunidade científica de que as mudanças climáticas estão sim ocorrendo, e de que as ações humanas são sim responsáveis por isso. Um estudo publicado em 2013, liderado pelo Dr. John Cook do Global Change Institute, University of Queensland, na Austrália, mostrou que a maioria esmagadora (97%) dos cientistas concorda que o aumento antropogênico (isto é, causado pelo Homem) da concentração de gases do efeito estufa é a principal causa do aquecimento global que vem sendo observado. O quinto relatório do IPCC também concluiu que a influência humana no clima da Terra é clara, sendo que há um alto grau de confiabilidade (probabilidade de mais de 95%) de que as atividades humanas nos últimos 50 anos são responsáveis pelo aquecimento observado em nosso planeta.

Além da geração de gases do efeito estufa, a emissão de poluentes também produz aerossóis, os quais podem interagir com a radiação solar e afetar a formação de nuvens, o que por consequência pode alterar o balanço de energia no sistema terrestre e contribuir para as mudanças climáticas.

Mudanças na maneira como o Homem usa a terra (por exemplo, florestas, fazendas ou cidades) também podem causar efeitos locais, alterando a refletividade da superfície da Terra e mudando o grau de umidade de uma região.

Quais impactos projetados para o Brasil no clima futuro?

Os relatórios do IPCC têm mostrado que o aquecimento global mudará o clima no Brasil de tal forma que a temperatura deverá aumentar em todo o país. Um clima mais quente ocasionará uma redução de geadas no Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. Já os impactos na chuva ocorrerão de diferentes formas dependendo da região. Por exemplo, chuvas muito intensas poderão ocorrer com maior frequência no Sul e Sudeste, enquanto que as estações chuvosas e a intensidade das chuvas no Norte e Nordeste deverão diminuir. Juntamente com as temperaturas mais elevadas, a diminuição nas chuvas tornará os ecossistemas amazônicos no norte do país mais suscetíveis a um possível colapso, reduzindo ou até mesmo modificando a sua vegetação. No caso do Nordeste, o aumento da temperatura por si só poderia exacerbar problemas existentes com as secas, causando maior evaporação das águas dos reservatórios, lagos e rios. O mapa a seguir ilustra os principais impactos e efeitos projetados para o clima do Brasil até 2100.

PROJEÇÕES CLIMÁTICAS PARA O BRASIL ATÉ 2100

As mudanças climáticas são evitáveis?

Como vimos, o aquecimento global já está em curso, as mudanças climáticas já estão acontecendo e são notáveis em todo o mundo. Infelizmente, não é mais possível evitá-las. Porém, ainda é possível atenuar suas consequências através da diminuição das emissões globais de gases de efeito estufa. Neste sentido, um acordo foi feito entre diversos países, incluindo o Brasil, na Conferência das Partes em Paris em 2015. O acordo determina que esforços sejam feitos para reduzir as emissões globais de CO2 e parar ou reduzir o desmatamento global. Com isso, o aquecimento global deverá ficar abaixo de 2oC nas próximas décadas. Para que tenhamos sucesso nessa empreitada, é preciso lidar com questões de larga escala, como uso de transportes mais limpos, geração de energia mais limpa, produção de alimento sustentável e redução ou término de queimadas. O Brasil comprometeu-se, através da aprovação do Congresso Nacional, em aumentar a participação de bioenergia sustentável, ou seja, aquela proveniente da matéria orgânica de origem vegetal e animal, para aproximadamente 18% e introduzir energias renováveis na matriz energética em aproximadamente 45% até 2030. Além disso, o Brasil tem o compromisso de restaurar e reflorestar 12 milhões de hectares de florestas. Nossos esforços individuais também podem ajudar a conter a emissão de gases de efeito estufa em longo prazo, através de pequenas ações diárias como, por exemplo, menor produção de lixo e melhor tratamento ao mesmo, freamento do desmatamento, consumo mais consciente de água e de energia elétrica etc.

Mudanças climáticas e COVID-19: alguma relação?

A pandemia de COVID-19 é um dos grandes desafios do século XXI, causando diversos impactos na saúde, perdas humanas e econômicas. A causa da COVID-19 ainda é investigada e várias hipóteses sugerem que um dos caminhos para seu surgimento e disseminação, assim como de várias outras doenças infecciosas emergentes, sejam as interferências antropogênicas no meio ambiente e o aquecimento global. De fato, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente aponta que este é o caminho de diversas outras zoonoses (doenças infecciosas transmitidas por animais para humanos) emergentes (exemplos: SARS, MERS, Ebola etc). Embora as mudanças climáticas não tenham sido a causa direta do surgimento da COVID-19, existem possíveis inter-relações entre elas. Desmatamento, aquecimento global e perda de habitats naturais deixam os animais mais suscetíveis à captura e tráfico. Esta aproximação entre animais selvagens, domésticos e humanos facilita o contágio de doenças infecciosas. Por outro lado, para tentar conter a disseminação do vírus causador da COVID-19, o SARS-CoV-2, muitos países adotaram medidas de restrições, fazendo que as pessoas fiquem mais dentro de casa, evitando aglomerações nas ruas e estabelecimentos em geral. Estas restrições levaram a uma redução temporária de gases de efeito estufa, como o CO2 que teve uma significativa redução durante o primeiro semestre de 2020. Isto mostra que nossos hábitos de consumo e vida precisam ser repensados e modificados se quisermos viver em um planeta mais saudável.

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PAINEL BRASILEIRO DE MUDANÇAS CLIMÁTICAS (PBMC). Base Científica das Mudanças Climáticas. Contribuição do Grupo de Trabalho 1 do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas ao Primeiro Relatório de Avaliação Nacional sobre Mudanças Climáticas. Ambrizzi, T; Araujo, M (Orgs.). Rio de Janeiro: Coppe/Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2014.

PROGRAMA DAS NAÇÕES UNIDAS PARA O MEIO AMBIENTE (PNUMA). UN environment programme, 2020. Ementa (descrição). Disponível em: https://www.unenvironment.org/pt-br/noticias-e-reportagens/reportagem/6-fatos-sobre-coronavirus-e-meio-ambiente. Acesso em: 10 de setembro de 2020.

REBOITA, M. S. et al. Regimes de precipitação na América do Sul: uma revisão bibliográfica. Revista brasileira de meteorologia, v. 25, n. 2, p. 185-204, 2010.

REBOITA, M. S. et al. Entendendo o Tempo e o Clima na América do Sul. Terra e Didática, v. 8, n. 1, p. 34-50, 2012.

SILVA DIAS, M. A. F.; da SILVA M. G. A. J. Para Entender Tempo e Clima. In: CAVALCANTI, I.D.A.; FERREIRA N.J.; DA SILVA, M. G. A. J.; SILVA DIAS, M. A. F. (Orgs). Tempo e Clima no Brasil. São Paulo: Oficina de Textos, 2009, p. 15-21.

WENDEL, J. Will COVID’s cleaner skies muddy climate models? Eos, 101, 2020. Disponível em: https://eos.org/articles/will-COVIDs-cleaner-skies-muddy-climate-models

YNOUE, R. Y. et al. Meteorologia: noções básicas. São Paulo: Oficina de Textos, 2017.



Sugestões de leitura

JACOBI, P. R. et al. Temas atuais em mudanças climáticas: para os ensinos fundamental e médio. São Paulo: IEE – USP, 2015.

YNOUE, R. Y. et al. Meteorologia: noções básicas. São Paulo: Oficina de Textos, 2017.


Links relacionados e sugeridos para leitura

https://climatekids.nasa.gov/climate-change-evidence/
https://climate.nasa.gov/causes/
https://www.skepticalscience.com/empirical-evidence-for-global-warming.htm
https://www.skepticalscience.com/human-fingerprint-in-global-warming.html
http://ofitexto.arquivos.s3.amazonaws.com/Meteorologia-nocoes-basicas_DEG.pdf
http://www.livrosabertos.sibi.usp.br/portaldelivrosUSP/catalog/book/315


Créditos

Textos: Tércio Ambrizzi, Amanda Rehbein, Lívia Márcia Mosso Dutra, Natália Machado Crespo

Capa (ilustração e arte) doada por: Júlia Rehbein Garcia

Coordenação gráfica e projeto de miolo: Angela Mendes

Ilustrações de miolo: Fran Matsumoto

Design e desenvolvimento web: Lucas Raposo

Quiz (design e programação): Lucas Raposo

Contato

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